Em 19 de Outubro do ano 2000 tinha, com uma equipa do então Centro Nacional de Arte Rupestre, identificado esta rocha gravada com arte pós-glaciar, no Vale do Sabor, perto do sítio conhecido como Cabeço do Aguilhão.
Não sendo um sítio ameaçado e estando a minha equipa absorvida pelos trabalhos no Guadiana (Alqueva), realizei o seu estudo cerca de três anos depois, num momento em que se identificaram e estudaram outras rochas gravadas na mesma zona do rio, perto do santuário de Santo Antão da Barca (todas pós-glaciares).
Infelizmente e pese embora não se divulguem as coordenadas destes achados avulsos, não será difícil, ainda que a olhares menos experimentados, redescobrir (e vandalizar se for caso disso) estes sítios, isolados e não protegidos, que guardam alguns dos mais interessantes vestígios da imagética do nosso passado pré-histórico.
Claro que o vandalismo é intencional, um pobre híbrido zoomórfico, mal picotado e intencionalmente sobreposto ao cervídeo em estilo tardo-neolítico/calcolítico.
Uma consequência das polémicas que envolvem a construção de mais uma barragem? Quase seguramente, mas antes de mais uma prova da irremediável ignorância e incultura que grassa no "país real".
Uma segunda rocha com um equídeo picotado, foi então detectada e estudada junto ao já conhecido painel do cervídeo:
Claro que haverá novas rochas com arte rupestre no Vale do Sabor, até porque o vale nunca foi objecto de prospecções especializadas em arte pré-histórica... E, entretanto, o CNART foi extinto...
Claro que haverá novas rochas com arte rupestre no Vale do Sabor, até porque o vale nunca foi objecto de prospecções especializadas em arte pré-histórica... E, entretanto, o CNART foi extinto...
Fotos: AMB/Manuel Almeida/CNART
Desenhos: Fernando Barbosa/CNART
4 comentários:
Ironias. Ou talvez não. Só provavelmente o património religioso será salvo deste atentado chamado "Barragem do Baixo Sabor", trasladado para longe do grande dilúvio que os novos deuses impõem, desta vez porque, certamente, os animais (vivos e de pedra) se terão comportado mal na Terra (no seu infinito saber, Eles saberão porquê). Mas só a fracção "moderna" e a que respeita os vivos: capelas, cemitérios, ... Deuses tolerantes com o Deus católico, claro está. Mas informados o suficiente para saberem que não houve deuses antes d'Eles e do Outro. Estes deuses têm cursos de formação, dominam o inglês e sabem que não são Eles os mesmos a quem os que em tempos idos rabiscaram as rochas "reportavam" (é assim que eles falam, pós-cursos de formação). Os rabiscadores não oravam ao Deus certo. Eram, coitados, (seres) tão antigos, que não podiam saber que a Entidade a quem temiam e a quem pediam e a quem ofereciam não era a real. Só os que vieram muito depois alcançaram conhecê-l'O.
Mas os actuais são também deuses progressistas, avaliadores das reais necessidades, cientes das inadequações ao Portugal e ao Mundo Moderno de minudências como a Arca de Noé, colossal navio pilotado por personagem simpática mas irrealista num país que se quer moderno. Se "vivo" no Portugal actual, Noé seria, aos olhos d'Eles, um excedentário. E colocado no quadro respectivo.
Quando se afirma, como hoje se ouviu da boca de Mário Lino a propósito do aeroporto de Alcochete e sabendo-se que, pelos vistos, a obra vai começar antes de terminados os estudos de impacto ambiental, que "todos os cuidados ambientais vão ser tomados", percebe-se (ou continua-se a perceber) que nada disto é sério. Quando se ouve o Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território culpabilizar os ambientalistas pelo atraso na criação do centro de recuperação do lince-ibérico (que, recorde-se, surgiu como "medida de compensação" pela construção da barragem de Odelouca, construção essa que se atrasou graças às acções em tribunal interpostas pelo movimento ambientalista contra a barragem precisamente por... situar-se em território de ocorrência do lince...) e tudo fica na mesma, percebe-se que nada disto é sério.
Quando se desvaloriza e se abandona e se destrói desta forma o património único, irrepetível por definição, percebe-se que nada disto é sério.
Estes deuses modernos não são, porém, insensíveis. A seu tempo formarão um cortejo de Pastores que, nos púlpitos de seus indestrutíveis templos, cuidarão de orientar e reconfortar os infelizes que valorizam/valorizaram estas coisas do passado. Lá estaremos, António.
Caro Dr. Martinho Baptista, a propósito de barragens, tomei a liberdade de colocar um link para este seu post no Avenida Central (http://avenidacentral.blogspot.com/2008/10/dos-autarcas-do-interior-manuel.html).
Cordialmente,
Gonçalo Cruz
É triste que procurem apagar de forma selvagem tudo aquilo que pode dificultar a construção da barragem. O que conseguem algumas promessas de progresso!
De facto é triste ver o Vale do Sabor ser destruído desta maneira. Eu conheço relativamente bem este vale porque moro a meia dúzia de quilómetros do rio. Por isso sei muito bem o que se vai perder com a construção de mais uma barragem. Como aluno de Arqueologia da Universidade do Minho, com um interesse acrescido pela Pré-história antiga, já fiz as minhas prospecções nos painéis xistosos que se encontram num dos seus afluentes e porque já li alguma bibliografia do Dr. A. M. B., pude constatar que num deles havia centenas de incisões. De facto, não consigo explicar do que se trata. Não sei se o Dr. A. M. B. os identificou mas talvez fosse interessante dar uma "olhadela". Gostava, se for possível, de entrar em contacto consigo (via mail) para pedir algumas informações que gostaria de adquirir para que, numa das minhas próximas prospecções, fosse com mais certezas e até para, quem sabe um dia, eu partilhar as minhas informações consigo.
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