sexta-feira, 31 de julho de 2009

Futebol e Arte do Côa. Da relatividade da arte.

Gosto de futebol, mas não sou doente da bola. E sempre que posso e a dolência se impõe, lá vou lançando o olho a uns tantos lances de jogo-jogado (como por aí se diz) que as televisões hoje transmitem ad nausea.
Pois há dias chamou-me a atenção uma pirueta futeburlesca-circense de Cristiano Ronaldo (uma espécie de finta de calcanhar - muito trabalho, muito trabalho!), passada e repassada à exaustão, e que mereceu do televisivo comentador encartado o epíteto de "obra de arte"! Que o homem depois repetia, afirmando que "é mais outra obra de arte" do "nosso" CR, hoje amado e endeusado e digno e... tudo o que vocês quiserem... representante de Portugal. Certamente pela riqueza acumulada a poder de chuto, o madrileño CR9 é hoje (infeliz ou felizmente?) talvez o mais conhecido representante do rectângulo. E pelos vistos um fazedor de "obras de arte"... com os pés. O que, não sendo original (lembram-se dos artísticos cartões de Natal pintados com os pés?), não deixa de ter a sua piada, já que afinal hoje parece poder ganhar-se mais riqueza e fama com os pés do que com a cabeça...

Eu sei que definir arte é quase uma tarefa vã, tanto e tudo hoje ali cabe. E certamente que as piruetas e passes milimétricos de CR para muito boa gente são "obras de arte", ainda para mais regiamente pagas quanto socialmente reconhecidas!

Mas o que separa afinal as "obras de arte" de Cristiano Ronaldo, dessoutras, para mim (e já agora também para uns tantos maduros que acham que aquilo são mais do que vulgares rabiscos) mais autênticas e sensíveis, plasmadas há milhares de anos nas rochas que marginam o Vale do Côa? Ou dos nossos próprios desenhos que as decalcam (obrigado Fernando pelo teu talento nesta missão tão pouco valorizada e miseravelmente remunerada) e dessa forma mais facilmente as transmitem ao gozo e fruição das gentes do presente?
Aparentemente tudo, mas mesmo tudo, as separa! Desde logo na aceitação popular - mas o mesmo toque de calcanhar de um vulgar jogador de uma vulgar equipa, já não é para esse mesmo comentador uma "obra de arte", talvez por não ter assinatura à altura. Eu sei que a arte não está, estando. E é a emoção que nos alcandorou a reis da criação. E na arte tudo se contém, até a relatividade do efémero.

Considerando-se que afinal tudo isto, alguns chutos e passes de CR e as gravuras do Côa são "obras de arte" de pleno direito (e nem outra coisa poderiam ser porque nestas coisas não há meio-termo), porquê tal distinção na valorização social e no reconhecimento de ambas as "instalações"?

E se CR nos bate largamente aos pontos (e aos contos que agora são euros), não é chegado o momento da Unesco classificar também as "obras de arte" de Cristiano Ronaldo como Património da Humanidade? E bastaria isso para em próximo concurso televisivo CR destronar Salazar do título patético que lhe atribuiu a RTP1 de "maior português de Portugal"? E com isso lavarmos a manchada honra do convento?

quarta-feira, 8 de julho de 2009

+ Planos para o Vale do Côa!

Assisti hoje à tarde a uma curiosa sessão de endeusamento maravilhado das gravuras do Côa. Sem direito a perguntas/comentários e é pena. Prepara-se então o terreno... mas Foz Côa tem um problema, um grave problema, tem um clima chato e o verde aqui não é de esperança, é de desafio...
Sob encomenda da Associação de Municípios do Vale do Côa, a Augusto Mateus & Associados apresentou o "seu" Plano Estratégico de Promoção Turística do Vale do Côa. Onde se descobre (maravilha fatal da nossa idade) que afinal são as gravuras do Côa e as paisagens envolventes a única coisa que fará sair Vila Nova de Foz Côa e os outros 9 municípios vizinhos (bem esticados de Mogadouro ao Sabugal) do subdesenvolvimento turístico onde têm vegetado! Por culpa tão-só dos competentíssimos arqueólogos que fizeram (e bem, diz-se) o trabalho que tinham que fazer, mas que agora há que entregar a gestão turística da coisa a outros e mais credenciados profissionais de outros ramos. Está certo! Então não é que os arqueólogos parece quererem as gravuras só para eles!!?? Até os filhos tarde ou cedo dos pais se eclipsam...

Mas esta malta acredita mesmo nisto?
E eu que passei até à exaustão os últimos 12 anos em afanosas, poliglotas e gratuitas explicações in loco sobre as maravilhas da arte pré-histórica do Côa. O tempo que eu perdi nisto. Já tinha publicado mais 2 ou 3 livros sobre o caso (é o que sobra da espuma das noites) e afinal andava era por aí a contribuir para afastar os turistas. Mas afinal o que andaram a fazer os tipos do turismo? Aprenderam ao menos alguma coisa?

Eis então aqui o tão falado e desejado modelo de gestão do futuro Museu do Côa e, já agora, do seu anexo Parque Arqueológico. Gestão ou congestão do território?

Porquê esperar mais? Proponho então que se entregue, e já, o Parque e o Museu (não, não é a maravilha de que Augusto Mateus hoje falava, mas isso são outros contos) à benemérita Associação de Municípios do Vale do Côa, se abram já a público todos os sítios por onde se espalham as gravuras (as velhas e as novas que aí virão) e se encerre já este ciclo medonho de tantas desgraças arqueológico-turísticas. E se comecem desde já a contar os (também eles) endeusados e endinheirados turistas. Para que de uma vez se faça stop à desertificação demográfica de todos os concelhos desta raia do subdesenvolvimento. Culpa também dos arqueólogos, claro, que partam rápido para outras andanças... eu por mim, sempre "nómada e vagabundo", estou pronto para marchar... com muita história para contar!

E, claro, a Augusto Mateus & Associados cumpriu a encomenda, embora essa coisa de se dizer que isto é assim como que uma espécie de exclusivo...