quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Siega Verde (Espanha) na rota do Vale do Côa


Siega Verde, no Águeda, um afluente do Douro, é o mais importante e denso conjunto de arte paleolítica de ar livre em Espanha. Em alguns aspectos pode quase dizer-se que é um prolongamento da Arte do Côa, com a qual se gemina em determinados particularismos: alguns temas da fase antiga e um bom lote de incisões de traço simples ou múltiplo genericamente do período Magdalenense, são talvez o que mais aproxima estes dois sítios arqueológicos. Mas é também muito o que os separa, como não podia deixar de ser em dois grandes sítios rupestres da Meseta ocidental.

Isto justifica plenamente que o governo espanhol e a Junta de Castilla y León tenham em curso um pedido de classificação do sítio à UNESCO, como Património da Humanidade, considerando-o uma "extensão de Foz Côa", o que em linhas gerais mereceu o meu apoio, na altura enquanto director do Centro Nacional de Arte Rupestre. É também nesta base que o Parque Arqueológico do Vale do Côa e os responsáveis do Património Histórico da Junta de Castilla y León têm neste momento em curso uma série de projectos conjuntos visando a valorização e difusão de ambos os nossos patrimónios rupestres.

Provando-se que o diálogo entre os dois lados da fronteira não pode ser palavra vã nestas regiões do interior peninsular, o Parque Arqueológico do Vale do Côa, com o apoio da Junta de Castilla y León e da Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa (que nos cedeu um autocarro), promoveu ontem (dia 12) uma visita aberta à população de Foz Côa ao sítio de Siega Verde. E para mim é sempre um prazer voltar a Siega Verde e partilhar a amizade e o profissionalismo dos seus guias e responsáveis.
 
Embora Siega Verde tenha muito menos visitantes do que Foz Côa (não mais de 4.000/ano contra os nossos quase 20.000/ano), e pese embora o sítio seja muito acessível por se encontrar ao lado de uma estrada que vem (ou vai) de (ou para) Ciudad Rodrigo, nem por isso os investimentos na conservação da arte rupestre e na sua divulgação foram estancados. Pelo contrário, após a construção e abertura de uma Aula Arqueológica (Centro de recepção e interpretação), a área de dispersão das gravuras, algumas centenas de metros ao longo da margem esquerda do Águeda, foi inteiramente vedada e aqui foi instalado, devido à sua fácil acessibilidade e aos inúmeros grafitos recentes, um sistema de videovigilância. E assim terá que ser, ainda que numa das mais deprimidas regiões de Espanha, no que aliás também se irmana com Foz Côa, em Portugal!

Sem as torreiras típicas dos nossos verões, a brisa ajudou ao sucesso da visita:

A Aula Arqueológica, dominando os sítios de arte rupestre, acolhe os visitantes à chegada a Siega Verde. Construída há poucos anos (e tão feia como a fachada da sede do PAVC!), será em breve inteiramente reformulada.


Maria de Jesus Sanches que se juntou ao grupo de Fozcoenses, na sua primeira visita a Siega Verde, posa ao lado dos "paleolíticos do Águeda".

E também a Delfina, uma guia do PAVC, não resiste ao apelo desta impagável figura. Vá lá saber-se porquê, mas os visitantes adoram fazer-se retratar com estes bisonhos figurões! 

Modelo da placa de sinalização dos sectores com gravuras

A guia Ketty explica os segredos de um dos mais interessantes painéis de Siega Verde, com uma das raras figuras de lobo (canis lupus) da arte rupestre peninsular, aqui gravado no interior de um auroque

Vista do sector central de Siega Verde com a ponte rodoviária em fundo

Grupo 1 de fozcoenses

Construída nos anos 20 do século passado, a ponte assenta um dos pilares centrais sobre um grande painel decorado com gravuras, que assim se viu segmentado por uma obra de engenharia moderna. Mas, na altura, não houve qualquer notícia ou registo da arte rupestre que assim foi mutilada.

A explicação de Ketty da gravura de cervídeo aposta numa concavidade vertical de um bloco de xisto, que seria escolhida para símbolo do sítio

Dois aspectos do painel 21 no interior dos "restos de uma antiga marmita de gigante", segundo Alcolea e Balbín.



Alguma documentação sobre o sítio arqueológico:

A completa monografia de Javier Alcolea e Rodrigo de Balbín, editada há 2 anos pela Junta de Castilla y León, que faz a síntese de quase 20 anos de pesquisa em Siega Verde. É o mais completo tratado sobre este importante sítio de arte paleolítica ao ar livre.

Guias de campo para acompanhamento das visitas:




Fotos: AMB
com os meus agradecimentos a Ketty, ao Carlos e restante pessoal que nos proporcionou esta visita a Siega Verde.

1 comentário:

Anónimo disse...

Como se dirá sarrabiscos em espanhol (não tenho o dicionário à mão)? Irra que o mundo inteiro está coberto de sarrabiscos. Até um tal Einstein quis tornar um muito célebre, um sarrabisco como E=mc2. Escrevam romances (sarrabisco bisco bisco), isso sim, ou ergam barragens (sarrabagens bagens margens), ou vão à caça (madraço madraça). Quiçá, uma central nuclear (com o tal E=mc2...). Leitor e espectador assíduo de MST em castelhano.